Em segundos, Marília Mendonça bateu o recorde de Jorge e Matheus e assumiu o topo mundial de visualizações simultâneas em uma live. Foram mais de 3 milhões de pessoas assistindo o show que além da audiência web, alcançou outro marco histórico: afetou diretamente o ibope da televisão.
Mas, o que essa transmissão ao vivo pode ensinar para o mercado da música? Listei alguns pontos:
1) Marca e propósito são tudo
Marilia anunciou a live (que faz parte do projeto Live no Sofá, promovido pelo Sesc Goiás e Fecomércio) em seu Instagram reforçando que não fazia sentido ser “apenas uma live“. “Além de curtir o seu show na sua casa, com muita moda boa e sofrência que você ama, nós vamos ajudar o pequeno negócio, pessoas e casas necessitadas“, disse a cantora. O QR code que direcionava à página de doações estava na tela durante toda a transmissão, as pausas no show davam espaço a propagandas de iniciativas ou pequenos negócios. O repertório foi escolhido pelos fãs via Twitter e a artista cantou apenas músicas compostas por ela. Isso! Além de bater um marco inédito de visualizações simultâneas na internet, ela foi a única compositora do país que fez um show completo apenas com canções próprias. Ao todo, foram 49 músicas, mais o bis dos hits Ciumeira, Me desculpe mas eu sou fiel e Todo mundo vai sofrer.
Em meio a uma pandemia, vender sua marca e seu propósito é mais importante (e útil) que vender o seu produto.
2) Aprenda com os erros (principalmente com os que não são seus)
Não demorou muito para a aglomeração de pessoas presente na live de Jorge e Matheus incomodar (com razão) os fãs. De olho no que não fazer, Marília cantou na sala de sua casa, com uma produção simples, equipe reduzida e reforçou todas as medidas de segurança que estavam sendo tomadas durante vários momentos da transmissão.
3) Em terra de televisão é a internet quem manda
Hoje, a primeira tela deixou de ser a televisão e se tornou o smartphone. Em 2017, 60% dos vídeos já eram assistidos primeiramente por meio de dispositivos móveis. Hoje em dia, esse número é ainda mais expressivo. Em meio a cobertura televisiva contínua sobre o Covid-19, os live shows trouxeram uma opção fresca para o entretenimento. Derrubar o ibope da Globo não é pouca coisa. Internet também não. Enquanto discutimos o “novo normal” o Brasil está catapultando a indústria em um momento de crise como pouco se vê mundo afora.
4) Tudo é planejamento
Até a mais simples das coisas exige planejamento. Ao vivo da sala de sua chácara e de chinelo, Marília entregou entretenimento, branding, publicidade, propósito e posicionamento. Você acha mesmo que dá pra fazer isso de um dia para o outro? O segredo dos artistas e marcas que surfam em formatos frescos é ter uma base de posicionamento bem definida. Planejar traz liberdade de criação e isso e uma lição para todos os setores, inclusive na música.
5) A rede não tem um único formato
Mais de 3 milhões de pessoas, cobertura em tempo real, memes, publis. Enquanto o show acontecia no YouTube, toda a internet pegava fogo — e a equipe de Marília sabia disso. Só no Twitter, a #LiveLocalMariliaMendonca ocupou o primeiro lugar nos trending topics Brasil e também apareceu nos TTs mundiais. Entre uma música e outra, a cantora, que fez grande parte do show de Havaianas, desafiou os fãs a postarem foto dos pés no Twitter, comentou seu look Riachuello, abriu espaço de publicidade para negócios locais. Quem não assistiu, não teve como fugir: os publis foram um sucesso e as menções à Marília estavam por toda a rede. Pode entrar, rainha da noite.
6) Live pra todo mundo ouvir
Ser inclusivo não é mais um diferencial (ufa), mas aqui, o que chamou a atenção, foi a maneira como os intérpretes também estavam envoltos na atmosfera do show. Mesmo com equipe reduzida, a acessibilidade foi prioridade para Marília. E com razão: além de garantir que todos os fãs pudessem aproveitar o show de maneira igualitária, eles roubaram a cena e protagonizaram as menções durante os comentários da transmissão e nas redes sociais. Se você decidir falar (ou cantar), permita que todos possam ouvir.
7) A indústria não pode parar
Com uma pandemia mundial em curso, a indústria da música ainda não sabe muito bem qual o seu rumo ou como se posicionar. Plataformas parecem não ser uma saída sustentável para monetização, datas foram canceladas e toda uma cadeia de profissionais sente os impactos de um cenário global que está nos transportando definitivamente para um novo mundo.
Criar novos formatos em tempos de crise fomenta uma discussão que está aquecendo a indústria. Enquanto grandes artistas batem recordes de streaming e atraem, literalmente, milhões de pessoas, a cena independente busca formas de se projetar em um cenário de pouca visibilidade. Falando por todo um mercado, Marília pediu que os fãs não solicitassem o estorno dos ingressos e reforçou que as apresentações não estão canceladas, mas sim, adiadas.
Também deixou uma atmosfera de que é possível se encaixar em novos modelos com uma produção reduzida: a autenticidade da cantora conduziu entre erros e acertos, o que foi até então o maior live show do país.
É impossível prever os próximos passos, estamos todos vivendo um dia de cada vez de acordo com as nossas possibilidades. Mas uma coisa é certa: a troca, criatividade e vulnerabilidade são, talvez, o caminho mais seguro para assumir que jamais seremos como antes e precisamos de novas respostas para novas perguntas.